A Escola Sem Fronteiras

A Escola Sem Fronteiras
Algumas pessoas não gostam de ditados populares. Dizem que são conhecimentos generalizados e por vezes contraditórios, e por isso mesmo, poucas vezes podemos utilizar o conhecimento do dito popular sem que em seguida alguém recorra também a outro ditado com conotação contrária ao primeiro, trazendo-nos confusão e dificuldade em agir de forma mais acertada diante de determinadas situações. Os ditados, por sua vez, acabam mesmo não servindo para nada. Embora, vez ou outra eu recorra a eles, como todo mundo.
E tão contraditório quanto à eficácia de um conhecimento comum baseado em ditados populares é sem dúvida, certos modismos educacionais, que muitas vezes de forma irrefletida, elevam e denigrem a imagem de métodos de ensino consagrados pela utilização comprovadamente eficaz na maioria de nossas escolas.
Há sempre uma nova didática despontando e que se baseia em conceitos ainda incipientes e em fase de comprovação elevando-os rapidamente às categorias de fatos e ideais de ensino,ou mesmo ideologias com pretensos embasamentos de caráter psicossocial envolvido.Evidentemente,denegrindo todas as outras metodologias anteriores.Assim foi com a Nova escola,o Construtivismo e até a Escola da Ponte,que executam um belo trabalho em Portugal,criando uma geração de crianças responsáveis pelo próprio caminhar do ensino,e que promete mais uma vez revolucionar o sistema educacional mais tradicional,baseado na relação professor –aluno.
Fui alfabetizada e fiz todo o meu ensino fundamental e médio em escolas tradicionais, mas me formei como educadora com especialidade em construtivismo, método com o qual alfabetizei por anos. Tanto um quanto o outro método são hoje vistos com desconfiança pelos modernos teóricos em educação, e mesmo desconfiados familiares, que custam em acreditar nos especialistas de qualquer área, já que nem mesmo eles são coerentes entre si, e em breve, algum deles fatalmente irá contradizer o outro, ou descobrir uma nova metodologia que nada mais é do que o bom e velho método tradicional “be-a :-bá”,com uma nova roupagem qualquer.
Outras metodologias igualmente eficientes, mas nem sempre trabalhadas em sala de aula , por não ser aplicada de forma responsável,por professores capacitados para tal,cuja grande maioria das escolas preferiu abolir tais metodologias sem mesmo conhecê-las de fato,são o método Montessori,a Pedagogia Waldorf e a já a citada Escola da Ponte,esses dois últimos modelos educacionais totalmente em desacordo com o modelo arraigado de educação em nossas mentes,porque a prioridade nessas pedagogias citadas é o aluno e a sua capacidade de escolha,e não um planejamento educacional que preconize planejamento conteudista em qualquer formato,tanto o tradicional,dividido em semestres,como o planejamento em projetos.Não há conteúdos específicos a serem trabalhados,porque não há professores,há especialistas que respondem aos anseios dos estudantes que definem quando e de que forma aprenderão qualquer conteúdo,em ninhos educacionais.
Algo semelhante ao ensino preconizado por Hermam Hesse(premio Nobel em Literatura) onde um professor renomado discutia em ninchos de alunos diletos,num modelo educacional que lembrava vagamente o método grego antigo- época dos filósofos Platão e Sócrates- utilizando-se de um jogo com regras herméticas para ensinar,no livro “O jogo das Contas de Vidro”mas era os alunos quem jogavam,ele só ensinava as regras do jogo.Sugiro que leiam este livro,pois mesmo que não seja um livro voltado para discussão sobre metodologias de ensino,é capaz de se tornar esclarecedor em algumas questões,e nos ensinar muito sobre isso,já que em qualquer lugar podemos aprender,porque cada um de nós é um educador em potencial,a qualquer tempo.Mesmo que seja uma história ficcional e o nosso professor não passe de um personagem.
Como professora, trabalhei por dois anos numa Classe de Educação especial numa escola com tradição Inclusiva. Era uma escola modelo, porque naquela época as crianças ou iam para uma escola especial,se fossem consideradas especiais, ou para uma escola regular,se normais. Não havia um meio-termo. Aliás, essa classe era o meio termo.
Dois extremos eram atendidos igualmente nesta classe especial. Um menino de apenas oito anos, com transtorno de hiperatividade e desatenção- conhecido como TDAH atualmente, na época não havia esse nome ainda, e a criança e somente um aluno acelerado- e um aluno de 20 anos sem ainda um diagnóstico fechado, por assim dizer. Contudo, a patologia dele sugeria transtorno compulsivo associando a um grau de algum tipo de deficiência cognitiva, isto é, ele não tinha a idade mental correspondendo à idade cronológica. Havia ainda autismo, epilepsia, cadeirante sem limitações intelectuais e um caso com deficiência intelectual leve, limítrofe - porém, que se podiam perceber algumas limitações cognitivas. Todas essas crianças eram atendidas na mesma sala, contudo, utilizando o mesmo método fônico. Algumas se adaptaram bem ao método, em especial o TDAH, mas o autista não, simplesmente ele nada acompanhava, e por vezes tentava fugir da sala de aula,o que confesso,teve êxito algumas vezes.
Durante o recreio ou atividade no pátio, o que era considerado inclusão na época era o fato de que as crianças desta turma podiam frequentar o ambiente em horários alternativos aos demais, além do que, o recreio era separado. Eles sentavam no refeitório numa mesa exclusiva deles, sem contato real com os demais alunos. Alguns, entretanto, não tinham comprometimento intelectual suficiente para que não percebessem a discriminação mais explícita e alguns deles, eram capazes de discernir quando sofriam com o preconceito velado, a que nós mesmos muito vezes sequer nos damos conta deles, feito por piadas, brincadeiras e olhares. É que a diferença constante os torna hipersensíveis; atentos ao menor sinal de bullying.
Essa classe semi especial, semi inclusiva ou... Enfim, como definir esta classe?Bem, essa classe a que me refiro já se encerrou há vários anos, e pensei que agora, graças á lei da inclusão, tais barbaridades seriam coisa do passado. A educação é para todos, não é?
A tarefa da inclusão não é somente inserir o aluno no mesmo espaço ambiental que os demais alunos, embora esta seja de fato uma situação real. Na família, ou mesmo na sociedade, os portadores de Necessidades Educacionais Especiais, chamado NEE- termo importado de Portugal , e o qual considerei incorporar no meu vocabulário- ao menos, as crianças especiais, transitam sem que para eles exista um espaço definido impedindo sua circulação e o direito constitucional de ir e vir.É ou não é?Se não é assim, então o erro já começa aí.
Todos são especiais e únicos, então, no meu entender, esse conceito de especialidade não se aplica. Como disse anteriormente, prefiro referir-me a eles com relação ás necessidades educacionais diferenciadas, e é tudo. Ponto. No mais, eu vejo pessoas, não pacientes, porque não sou médica, e nada além de crianças, porque é o que de fato são. Mas isso é uma visão particular minha, sintam-se à vontade para discordar do termo. A propósito, definir a nomenclatura a que nos referimos aos portadores de necessidades especiais sempre suscitou diversos debates do mais acirrados. Voltarei a este assunto em outra oportunidade.
Há ainda outras questões envolvidas em inclusão: conteúdo adaptado não é uma forma de dizer que o aluno não pode aprender o mesmo que os demais, e que este mesmo conteúdo será tão defasado a ponto de impedi-lo de acessar outras formas de conhecimento, como o ENEM ou mesmo o antigo vestibular, que algumas faculdades ainda utilizam como forma de ingresso.
Certamente esses alunos podem sim desejar alcançar o desafio da graduação ou ainda mais além-quem poderá dizer que não?A cada dia mais alunos NEE atingem esse ideal; Está na hora de repensar nossos conceitos. Já alertava Cazuza: ”Eu vejo o futuro repetir o passado, eu vejo um museu de grandes novidades, Porque o tempo não para.”... Eis um trecho de musica que poderia servir como um ditado popular, sem medo de qualquer outro possa revogá-lo, porque contém uma verdade nua e crua, não é?
Disseram que abolir as APAES -Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais- assim como as demais escolas essencialmente especiais ajudariam a diminuir o preconceito e as tornaram em Centros de Educação Inclusiva. Ainda assim, jamais vi crianças desses centros tendo ao menos um dia que fosse de atividades ou mesmo de visita a uma escola “normal” para interagir com as demais crianças, ou vice-versa; Isso, sem dúvida, seria o inicio da educação inclusiva ideal. Se o modelo separatista de antes não era um bom modelo que desejávamos manter em nossa sociedade PARA TODOS, tão pouco o atual modelo de inclusão está sendo bem trabalhado nas escolas como um todo.
”Quem se contenta com pouco jamais chegará a excelência.”
Outro pensamento de caráter irrefutável.
Michelle Paranhos








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