Resenha do livro "O Quinze" de Rachel de Queiroz
A narrativa
se inicia com a ambientação seca, dura e agonizante da terra sertaneja,
sedenta pelas chuvas da tradição: se chover até o dia de São José, não haverá
seca e a fartura reinará. Caso
contrário, a agonia será lenta e derradeira ,matando homens e animais, vegetação
e esperanças de uma foice só.
Mas a lua
parada no céu- como observou Conceição- sem lagoa, diz que a chuva não virá, e
a certeza da seca iminente é aterradora.
Conceição e
a madrinha Mãe Nácia (Dona inácia)contrastam em conhecimento e sentimentos com
os demais personagens, que pouco a pouco vão surgindo, se entrelaçando e
seguindo juntos como uma procissão a São José, fugindo da seca. Conceição ,moça
velha de 22 anos, desistira de se casar, mas substitui seus desejos de amor
pelos caprichos dos estudos(é professora formada na capital) e em pouco tempo,
aos cuidados com os chamados “Campo de Concentração”,
pois que assim se chamava aos lugares em que os retirantes se juntavam na
esperança que a sorte ajudasse, as chuvas voltassem e a fome desaparecesse, em
busca de esmola e oportunidades...que às vezes vinha, às vezes não. Quando
davam sorte, conseguiam se tornar imigrantes para outros estados, em busca de
empregos; quando não, morriam ali mesmo.
O primo de
Conceição era Vicente, vaqueiro, que luta contra uma onda de carrapatos em sua
rezes, um prenúncio do verão esturricante que se aproximava. Vai até Quixadá,
em visita à tia Idalina e aproveita para cortejar ,ainda que de longe, sem
palavras e mesmo, sem dar a entender, a prima Conceição.
È
correspondido, pela moça que só o enxerga um moço bonito, queimado de sol e que
da mesma forma que ele, apenas sonha com o romance que nem surgiu.
Vicente
conta as tristes notícias do campo, inclusive sobre o Compadre Chico Bento, vaqueiro
como ele, e sua mulher Cordulina e seus cinco filhos, que impulsionados pela
avareza da mulher dona da fazenda, rica ,mas que não quer abrir mão do dinheiro
para garantir a vida de animais e gente que dela depende nessa seca, resolve
por as porteiras abertas e soltar o gado à própria sorte. Chico Bento e Cordulina,
sua mulher e os cinco filhos ,indo fazer a viagem a pé-tamanha era a leva de
retirantes que não conseguiram bilhetes para viagem de trem- Vicente ajuda trocando
uma vaca por um jumento e um pouco de dinheiro útil na viagem que eles farão até Ceará, depois pro norte, Amazonas,
atrás da borracha...
No meio do
caminho a fome aperta e o dinheiro que
eles levavam era pouco para café,farinha e rapadura. A fome minguava as forças, e Mocinha, afilhada
de Idalina, é a primeira baixa: resolve partir em busca de coisa melhor, e
somente no final é que se sabe dela,
agora com filho, perdida, entregue à própria sorte, vai embora para não
mais voltar. Trocam o jumento magro ,pele e osso por comida: dinheiro pouco
para muita fome e sede.
O filho
Josias, morre de fome, lentamente, a cada dia e de uma vez só, envenenado...ao
se soltar da mão da mãe, ficar para trás ,e morre ao comer mandioca crua,
roendo o pequeno pedaço encontrado, encarquilhado, no chão de terra seca.
Pedro, o
mais velho, com apenas doze anos, vai em busca de socorro, ninguém mais soube
dele...
Depois de
muita chão,muita fome e dor,finalmente chegam Chico,a mulher e os três filhos
que sobraram ao Campo de Concentração. A mãe, condoída, deixa o pequeno filho,
ainda de colo, afilhado de Conceição aos cuidados da madrinha.. segundo o pai, melhor
entregar o pequeno filho moribundo, ardendo em febre, ao chão da comadre, do
que aos Urubus. Ensaiam lágrimas, que logo secam, como as chuvas que não vem.
Conceição , despeitada,
corroída pela maledicência das mulheres.
Acredita que
até então fizera papel de boba a sonhar com Vicente e vê como nunca o abismo entre
eles: intelectual ,social e o preconceito preenche o espaço do amor que nunca
chega, torna as barreiras do amor impossível de começar. Mas..Como matar o que
nunca existiu?
Assim, cria
o afilhado como filho, substitui o amor de mulher pelo de mãe, e ajuda a
conseguir passagens para Chico Bento, que embarca para são Paulo com mulher e
os dois filhos que lhe sobraram. A chuva chega e Quixadá sobrevive. Assim como
os retirantes, e o amor não concretizado de Conceição e Vicente.
O inverno
chega. As esperanças se renovam. Quem sabe o que o futuro reserva para as próximas
estações da vida de seus personagens?
Assim
,incerto é o fim da narrativa...pois
incerta é a própria vida e tudo pode mudar. Para melhor. Retrato da vida de uma
época, da seca de 1915,mas poderia ser de qualquer ano, de todos os anos,
porque as dores vem com as secas mas as esperanças, com a chuva, e a relva
verde no campo.
Escrito por Michelle Paranhos
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